Entre os dias 6 e 9 de novembro de 2024, a Universidade de São Paulo (USP) foi palco da quinta edição do Simpósio Internacional sobre Linguagem e Cognição (Lincog), um evento que se destacou por trazer à tona questões fundamentais sobre acessibilidade, diversidade e inclusão no ambiente acadêmico. Com o tema “Diversidades, Percepções, Acessos e Integração”, o evento reuniu acadêmicos, pesquisadores e professores com deficiência para discutir a importância de integrar as pessoas com deficiência no processo educacional, além de apresentar novos avanços em tecnologias assistivas.
A Inclusão no Cenário Acadêmico: Reflexões e Desafios
Uma das principais novidades desta edição do simpósio foi a presença ativa de pessoas com deficiência, especialmente pessoas cegas, como parte da programação oficial. Esse movimento reflete um importante passo para garantir que as discussões sobre acessibilidade não sejam apenas conduzidas por especialistas acadêmicos, mas também pelas próprias pessoas que vivenciam essas questões diariamente.
Maria Célia Lima-Hernandes, coordenadora do evento e professora da USP, destaca a importância de questionar as dinâmicas tradicionais de ensino. "Por que o acadêmico é quem tem que ensinar ao cego alguma coisa? Por que não podemos ser nós, pessoas com deficiência, a ensinar sobre a nossa realidade?", provoca Maria Célia. A frase “Nada sobre nós, sem nós” foi uma das mais citadas durante o simpósio, destacando a necessidade de um protagonismo real das pessoas com deficiência nas políticas de integração e nas discussões sobre deficiência.
Avanços na Acessibilidade: Ações e Projetos de Inclusão
A mesa de abertura do evento contou com a participação de importantes figuras públicas, como Marcos da Costa, secretário de Estado de Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo, que anunciou a criação de uma nova disciplina voltada à formação em Acessibilidade e Inclusão nas universidades estaduais de São Paulo. A “Disciplina Paulista de Acessibilidade e Inclusão” será oferecida em várias universidades, incluindo a USP, Unesp, Unicamp e a Univesp, com o objetivo de sensibilizar estudantes de todas as áreas para as questões da deficiência e preparar profissionais mais inclusivos.
Em sua fala, Costa ressaltou que o objetivo da disciplina é criar uma cultura de inclusão nas universidades, formando profissionais com uma visão mais ampla sobre as necessidades das pessoas com deficiência. “A intenção é tornar o aluno mais completo, capacitado para atuar em um mundo inclusivo”, afirmou o secretário.
Pesquisas e Tecnologias Assistivas: A Ciência a Favor da Inclusão
Além das discussões sobre políticas públicas, o simpósio também foi um espaço para a apresentação de pesquisas inovadoras. Um dos destaques foi o projeto interdisciplinar coordenado pela professora Maria Célia Lima-Hernandes, que investiga como pessoas com deficiência visual processam metáforas. Utilizando tecnologias avançadas como a ressonância magnética, a pesquisa busca entender quais áreas do cérebro são ativadas quando essas pessoas identificam metáforas em discursos audiodescritos. O estudo promete trazer contribuições valiosas para a melhoria dos recursos de audiodescrição, ampliando a compreensão de como as pessoas cegas processam a linguagem figurada.
Outro destaque foi o trabalho de Cleyton Ferrarini, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR), que desenvolve projetos de tecnologia assistiva para facilitar a acessibilidade na educação e nas interações cotidianas de pessoas com deficiência. Esses projetos buscam transformar a forma como as tecnologias podem ser utilizadas para integrar pessoas com diferentes tipos de deficiência ao ambiente acadêmico e profissional.
A Arte como Ferramenta de Inclusão: A Exposição COMtornos
O evento também teve um componente cultural significativo, com a inauguração da exposição “COMtornos”, idealizada pela artista Karen Montija, da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP. A mostra trouxe esculturas de silhuetas de pessoas com deficiência, com o intuito de proporcionar uma experiência multissensorial. As obras tridimensionais foram projetadas para serem tocadas, permitindo que pessoas com deficiência visual tivessem uma experiência mais completa da arte. A exposição foi uma forma de aproximar as pessoas com deficiência das artes plásticas, um campo muitas vezes inacessível devido à falta de recursos e adaptações.
Marcelo Venturini, estudante de Letras da USP e deficiente visual, ressaltou a importância da exposição para a compreensão de conceitos artísticos. “Os desenhos em relevo são uma forma de familiarizar a gente com a representação de imagens. É uma maneira de nos trazer para mais perto da arte”, afirmou ele.
Reflexões Finais: A Necessidade de uma Educação Inclusiva
O Simpósio Lincog 2024 foi um marco na discussão sobre a integração de pessoas com deficiência no meio acadêmico. A presença de pessoas com deficiência na organização, nas palestras e nas exposições deixou claro que a inclusão vai além de ajustes físicos ou tecnológicos, envolvendo um real engajamento de toda a sociedade e das instituições educacionais. Como destacou a professora Maria Célia Lima-Hernandes, as universidades precisam repensar suas práticas pedagógicas e garantir que todas as vozes, especialmente as de quem vive com deficiência, sejam ouvidas e respeitadas.
Com isso, o evento não só ampliou a compreensão sobre as dificuldades enfrentadas pelas pessoas com deficiência, mas também mostrou que há um caminho promissor a ser seguido, com o apoio da academia e da sociedade.
Para mais informações, consulte a matéria oficial no link: Simpósio Internacional sobre Linguagem e Cognição.
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